Feliz aniversário, Burn Out
by Stella Furquim
Hoje meu burn out completa 11 anos! Sobrevivi.
Não sem marcas. Tenho muitas cicatrizes. Mas sou uma otimista bem teimosa e sei que um dia, minhas cicatrizes estarão completamente curadas.
Eu havia usado minhas últimas gotas de energia para andar 600m de ida e 600m de volta, pegar meu filho de então 7 anos que voltava da escola.
Fevereiro é um mês de temperaturas frígidas em Montreal, local onde eu morava. Estava -15oC.
Lembro-me como se fosse hoje, eu tive uma febre bem baixinha o dia todo e estava com uma tremedeira. Uma amiga ao telefone me sugeriu tomar um chá bem quente antes de sair “para esquentar por dentro”. Fiz isso, me vesti com a roupa e botas de inverno, vesti meu caçula de 18 meses, coloquei ele no “backpack” e fui.
Quando voltamos pra casa, ligamos via skype para desejar um feliz aniversário para minha irmã, mas não aguentei ficar sentada a ligação toda.
Fui me deitar. Ao fundo ouvia meu filho mais velho falando com minha mãe e a ouvia perguntando: Cadê sua mãe?
Eu não aguentava mais e não sabia o que fazer …tentei ficar funcional até que o pai deles chegasse em casa, às 17h45. Eram 16h15. Ele não admitia que eu o ligasse caso precisasse dele durante o dia e o perturbasse no trabalho.
Às 17h eu já não conseguia aguentar mais, sentia que iria desmaiar e que meus filhos ficariam desesperados. Liguei para uma pessoa que conhecia e que morava perto e pedi para que ela viesse olhar os meninos até que o pai chegasse. Eu precisava ir à emergência.
Ela veio mas quando chegou eu já estava delirando, segundo ela. Eu não lembro.
A próxima lembrança que tive era de estar embarcando, pela primeira vez numa ambulância, de maca. O pai dos meus filhos estava junto e eu só repetia: estou muito cansada, fala que só consigo falar em português.
Montreal é uma cidade que na prática é bilíngue, inglês e francês. Os profissionais da saúde falavam comigo ora em francês, ora em inglês e eu entendia, mas só conseguia responder em portugues.
Eu estava exausta. Eles acharam que eu tinha tido um AVC.
No hospital fizeram vários exames, reuniram muitos médicos e discutiram a minha volta as possíveis causas para este fenômeno. Não havia evidência de um AVC ou possível tumor na área que afetava a linguagem. Além de ressonância e tomografia fizeram uma punção lombar.
Depois de 48h descansando no hospital, pude voltar para casa. Descobri que meus filhos foram para a casa de uma amiga e que o pai não ligou para eles nenhuma vez em 48h para saber como estavam nem tampouco perguntou para a mulher que os acolheu se ela precisava de algo. Minha mãe estava completamente apavorada pelo meu sumiço de 48h pois o cidadão, na época meu marido, não atendeu telefone e nem respondeu as mensagens da secretária eletrônica. Ele também não falou no trabalho da situação, não pediu um day off para cuidar dos filhos. A vida dele seguiu normalmente.
Os exames comprovaram que não era “nada” além de um relacionamento abusivo. Eu era mãe-solo casada e a carga-mental ficou pesada demais.
Eu ainda seguiria 4 anos e meio casada. Não é fácil sair de um relacionamento abusivo. Adicione aí o fato de ter 2 filhos menores de idade e ser imigrante no país onde morava (mesmo já tendo cidadania).
Antes de finalmente sair desta enrascada, eu tive um diagnóstico de doença auto-imune. Mas esta história já é outra..